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Por Instituto Escolhas

18 agosto 2020

5 min de leitura

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Sergio Leitão assina artigo no Valor Econômico e aponta a necessidade de uma matriz de risco socioambiental em investimentos de infraestrutura

A retomada verde pós-pandemia vem trazendo novos contornos em relação a investimentos nacionais, internacionais, tomadores de decisão, instituições financeiras e as políticas relacionadas ao meio ambiente e aos riscos socioambientais de investimentos em infraestrutura.

“É urgente unificar e aperfeiçoar critérios para governança e riscos sociais e climáticos, em particular no campo da infraestrutura, vista hoje como oportunidade de gerar investimentos, impulsionar a economia e reduzir os danos criados pela pandemia.” afirma o diretor executivo do Escolhas em artigo.

Leia na íntegra abaixo:

Por uma matriz de riscos ambientais | Opinião | Valor Econômico

Sergio Leitão

Incertezas, dificuldades e retrocessos não impediram, no Brasil, políticas ambiciosas contra desafios nacionais –
como o Plano Real, o regime de metas contra a inflação e a Lei de Responsabilidade Fiscal para guiar as contas
públicas. Nas últimas semanas, outra ameaça tem levado empresários, banqueiros e até personalidades
internacionais a exigir resposta urgente: os brasileiros precisam de criatividade e compromisso para romper as
fortes resistências do atraso e agir com maior eficácia contra a degradação ambiental.

Ficará em segundo plano, e perderá oportunidades, qualquer nação ou empresa que ignorar essas exigências de
melhores práticas ambientais, sociais e de governança (conhecidas pela sigla ESG, da abreviatura em inglês).
Exemplos de outras nações mostram que o Brasil já está atrasado: necessita de bases mais sólidas para proteger
pessoas e empresas das graves consequências da crise climática. É crescente o sentimento negativo de consumidores e parceiros comerciais e financeiros contra quem não prioriza a responsabilidade social e a prevenção de causas e efeitos do aquecimento global e da deterioração dos recursos naturais do planeta.

É urgente unificar e aperfeiçoar critérios adotados em matéria de governança e riscos sociais e climáticos, em particular no campo da infraestrutura, vista hoje como oportunidade de gerar investimentos, impulsionar a
economia e reduzir os danos criados pela pandemia da covid-19.

Não podemos deixar que a temporária oferta de liquidez criada pelas ações estatais contra o novo vírus encubra
riscos reais, ligados aos fatores ambientais, sociais e de governança, que ameaçam a rentabilidade e mesmo a
viabilidade futura de certos projetos, com possíveis reflexos negativos para seus financiadores. Ser ambicioso nesse
tema significa dar maior atenção às consequências dos financiamentos a projetos potencialmente danosos ao meio
ambiente.

O país tem de adotar uma matriz de riscos ambientais, para uso obrigatório na seleção de projetos e na decisão
sobre seu financiamento. Essencial, nesse processo, será a adesão de autoridades do setor público, como o
presidente do Banco Central, e líderes do setor financeiro, entre eles os presidentes dos maiores bancos do país.

A crise financeira internacional na década passada levou à criação do Financial Stability Board (FSB), uma
organização formada pelas economias mais influentes do mundo para prevenir e reforçar a ação de governos e
instituições contra ameaças à solidez e à liquidez dos mercados financeiros. Sinal dos tempos, mais recentemente, o
FSB criou uma força-tarefa especial, a TCFD, para dar maior visibilidade aos riscos que os efeitos das mudanças
climáticas trazem ao setor financeiro.

Essa iniciativa contrapõe-se à ideia equivocada de que as consequências da crise climática são de longo prazo e não
seriam relevantes para as decisões atuais de negócio. A TCFD deve ser a referência, no Brasil, da ação para orientar
bancos e fundos de investimento no esforço por uma economia verde e sustentável.

Outros países, aliás, já saíram na frente. Na França, reguladores do setor financeiro inauguram, em setembro, seu
Comitê para o Clima e Finanças Sustentáveis, que, baseado nas recomendações da TCFD, irá monitorar mais
detidamente os compromissos ambientais dos bancos e outras entidades no país, e controlar seus resultados
práticos; no Reino Unido, os reguladores promoveram consulta pública para reforçar o monitoramento dos
compromissos ESG das entidades financeiras e decidir sobre nova regulação: maior transparência pode reforçar a
resiliência do mercado, ao dar mais qualidade à avaliação dos ativos e às decisões sobre onde alocar capital,
argumentam as autoridades britânicas, inspiradas pela TCFD.

Os reguladores britânicos notam que tem crescido a adesão voluntária aos princípios da força-tarefa para
divulgação de riscos financeiros associados ao clima; mas acreditam que as evidências do mercado dão apoio à ideia
de intervenção governamental para acelerar o progresso nesse campo.

O Instituto Escolhas tem buscado, desde maio, em consultas com o governo e agentes de mercado, uma
convergência em torno da avaliação de riscos ESG orientada a precificar e orientar investimentos. Nosso objetivo é
estabelecer uma matriz, a ser aplicada pelo setor bancário ou entidades financeiras em geral, mas vai além:
precisamos de mecanismos legais ou regulatórios como critério indispensável na aprovação de financiamentos e
investimentos. É um projeto ambicioso para posicionar o Brasil na liderança e gerar enormes recompensas em
termos de atração de investimentos e de eficiência na alocação de capital.

Há dificuldades evidentes, desde questões técnicas para calcular os custos associados aos riscos da matriz a ser
aplicada pelos bancos até a necessidade de unificar as diversas metodologias adotadas pelos diversos atores nos
mercados relevantes. A partir de workshops e consultas ao setor privado, agências de governo e outras autoridades,
promoveremos, até outubro, um seminário para apresentar a matriz de riscos a ser usada pelos bancos e
investidores.

Esse trabalho prevê sugestões de normas para que os agentes reguladores, munidos de dossiês qualificados,
garantam a aplicação harmônica e equitativa da nova metodologia.Investimentos favoráveis à transição para uma economia de baixa emissão de carbono ganharão preferência, com o agravamento das condições ambientais. Pesquisas do Morgan Stanley constataram, por exemplo, que 90% das pessoas de alta renda na faixa de 24 a 39 anos – os millenials – pretendem desenhar seus investimentos segundo critérios ESG. São filhos de uma geração, os baby boomers, que lhes legará uma herança, em ativos, superior a duas dezenas de trilhões de dólares.

A escolha é nossa: ficarmos com as opções associadas ao passado e ao retrocesso, ou prepararmos o arcabouço
regulatório indispensável para aproveitar as oportunidades que este futuro nos apresenta.
Sergio Leitão é advogado, empreendedor ambiental e diretor-executivo do Instituto Escolhas

 

Originalmente publicado em: https://valor.globo.com/opiniao/coluna/por-uma-matriz-de-riscos-ambientais.ghtml

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